O jornalista e consultor em comunicação institucional, Sebastião Panzo, defendeu uma abordagem mais estratégica e informada por parte dos comunicadores angolanos na divulgação dos dados sobre a indústria extractiva. A declaração foi feita na edição inaugural da nova temporada do programa Hora da Indústria Extractiva, um espaço multimédia dedicado à promoção da transparência e boa governação no sector.
Durante a sua intervenção, Sebastião Panzo explicou os fundamentos da Iniciativa para a Transparência nas Indústrias Extractivas (ITIE), sublinhando que o surgimento desta plataforma foi impulsionado por pressões da sociedade civil e ONG’s como a britânica Global Witness, culminando na sua formalização em 2002, durante a Cimeira Mundial sobre Desenvolvimento Sustentável em Joanesburgo.
“A EITI surge da necessidade de se clarificar quem se beneficia com a extracção dos recursos naturais, como são distribuídas as rendas e se há ou não justiça e transparência na sua gestão”, explicou o especialista.
Panzo destacou ainda os 12 princípios orientadores da ITIE, enfatizando três grandes eixos: o uso prudente dos recursos para o desenvolvimento sustentável, o dever de prestação de contas por parte das instituições públicas, e a necessidade de divulgação ampla para informar e envolver os cidadãos.
“A riqueza natural pertence ao povo, não aos servidores públicos que a gerem temporariamente. Portanto, há um dever de comunicação clara e acessível”, reforçou.
Segundo o comunicólogo, o maior desafio reside na compreensão da complexa cadeia de valordas indústrias extractivas como petróleo, gás e diamantes e na tradução dessa complexidade em narrativas compreensíveis para o cidadão comum.
“Faltam-nos ainda ferramentas e conhecimento técnico para interpretar dados de relatórios de contas, orçamentos e pagamentos. É um problema de literacia técnica e estratégica entre os próprios comunicadores”, alertou.
O convidado destacou igualmente, que actualmente há maior acesso à informação, com relatórios públicos disponíveis nos websites do Ministério das Finanças e de empresas públicas como a Sonangol. No entanto, questiona-se a capacidade dos comunicadores em interpretar correctamente esses dados.
“A informação está acessível, sim. Mas a sua leitura, consolidação e interpretação é que continuam a ser um desafio enorme”, afirmou.
Para além da comunicação técnica, Panzo defende uma mudança de paradigma na percepção do comunicador institucional, ainda muitas vezes visto como mero auxiliar operacional. Ele defende um papel mais estratégico, proactivo e humanizado na comunicação pública.
“O comunicador não deve apenas acompanhar o ministro ou convocar a imprensa. Ele deve compreender profundamente o sector, criar narrativas e influenciar o estado de opinião”, disse.
No que toca ao combate à corrupção e promoção da boa governação, Panzo destacou que muitas empresas do sector extractivo em Angola já seguem padrões internacionais de gestão e transparência, sobretudo por serem controladas por accionistas privados e sujeitas a auditorias globais.
“Nas empresas privadas, o risco reputacional impõe mecanismos internos rígidos contra a corrupção. Já no sector público, o problema persiste principalmente nos processos de adjudicação e na falta de transparência sobre quem são os verdadeiros beneficiários das empresas”, explicou.
Panzo apontou como um dos principais desafios actuais a falta de declaração pública dos accionistas de determinadas empresas com interesses na indústria extractiva, especialmente quando esses accionistas são figuras politicamente expostas.
“Ainda há resistência em divulgar os beneficiários efectivos de empresas que operam no sector. Isso cria espaço para conflitos de interesse e favorecimentos ilícitos”, alertou.
Segundo o consultor, os primeiros relatórios da ITIE Angola já identificam este “défice”, e instam o Estado a avançar com políticas de maior abertura e responsabilização. Por fim, Sebastião Panzo lança um apelo claro para que a comunicação na indústria extractiva angolana deixe de ser apenas técnica e passe a ser estratégica, formativa e transformadora. A literacia comunicacional, a transparência de dados e a responsabilização institucional são, segundo o especialista, as chaves para garantir que os recursos naturais beneficiem de facto toda a sociedade angolana.