RECURSOS NATURAIS DEVEM BENEFICIAR, EM PRIMEIRO LUGAR, AS COMUNIDADES LOCAIS – DEFENDE REVERENDO NTONI-A-NZINGA, COORDENADOR DA PLATAFORMA TCHOTA – ANGOLA

ITIE ANGOLA - Entrevista - RECURSOS NATURAIS DEVEM BENEFICIAR, EM PRIMEIRO LUGAR, AS COMUNIDADES LOCAIS – DEFENDE REVERENDO NTONI-A-NZINGA, COORDENADOR DA PLATAFORMA TCHOTA – ANGOLA

O Reverendo Daniel Ntoni-a-Nzinga, Pastor da Igreja Evangélica Baptista em Angola e Doutor em Teologia e Estudos Religiosos, defende uma exploração mais justa, transparente e inclusiva dos recursos naturais no país.

O também Coordenador do Tchota – Angola (Plataforma de Organizações da Sociedade Civil, criada em 2016, que visa promover a consciencialização e o envolvimento da sociedade nos desafios da exploração dos recursos naturais de Angola, focando na gestão e na justa distribuição dos rendimentos, assim como na defesa dos direitos das comunidades afectadas), destaca que os recursos naturais devem ser uma bênção para todos os angolanos, sobretudo para as comunidades que vivem nas zonas de exploração.

Durante a entrevista ao programa Hora da Indústria Extractiva, o Reverendo reflectiu sobre o lema de uma das conferências do Tchota, realizada em 2021: “Recursos naturais, uma bênção para todos”, afirmando que este ideal reflecte o propósito divino da criação.

“Do ponto de vista do objectivo que Deus teve quando criou, é exactamente isso. Fazer com que os recursos naturais estejam ao serviço uns dos outros, para o bem comum. Esse tem sido o objectivo fundamental da acção do Tchota”, disse.

O reverendo recorda experiências em diversas províncias do país, onde acompanhou de perto o impacto positivo do uso responsável dos recursos naturais na vida das comunidades, sobretudo das mulheres que se dedicam à agricultura.

“Fico muito tocado ao ver as mamãs colhendo os frutos do seu trabalho. É um sinal de que, quando fazemos bem o que devemos fazer com os recursos que Deus colocou em Angola, os resultados são bons”, declarou.

Indústria extractiva: um sector vital, mas com desafios sérios de transparência

O Reverendo considera a indústria extractiva como o “motor da economia angolana”, mas alerta para os sérios problemas relacionados à transparência e à partilha dos benefícios.

“Os povos que vivem onde Deus colocou esses recursos, praticamente não beneficiam do fruto da exploração. E isso é muito preocupante”, sublinhou.

Segundo o líder religioso, muitas vezes os lucros da exploração são canalizados para as cidades, enquanto nas zonas de origem persistem dificuldades básicas. “Constroem – se grandes prédios nas cidades, mas nas aldeias, quando chove, as casas desabam. Há consequências negativas da exploração que afectam até a agricultura local”, disse.

Participação comunitária e justiça social

Ntoni-a-Nzinga reforça que é fundamental que as comunidades afectadas sejam as primeiras beneficiárias dos recursos naturais, não apenas por justiça, mas também porque enfrentam directamente os efeitos negativos da actividade extractiva.

“A exploração mineira não pode fundamentar a exploração dos seres humanos. Quem vai ao fundo da terra com a catana são os locais, mas quem recebe os lucros está em Luanda”, denunciou.

Divulgação de receitas ainda é insatisfatória

Sobre a divulgação pública das receitas das empresas do sector extractivo, o Reverendo afirma que ainda está aquém do desejável.

“Mesmo os valores que são publicados, muitas vezes, só chegam a quem governa. Até hoje tenho dúvidas se todos dentro do governo sabem de facto. Não vejo relatórios públicos com os detalhes das explorações”, afirmou, defendendo maior acesso da população a estas informações.

Integração de Angola à ITIE: Um bom passo, mas é preciso fazer mais

Em relação à recente pontuação de Angola na Iniciativa para a Transparência nas Indústrias Extractivas (ITIE) – 63,5 numa escala de 0 a 100 – o Reverendo considera um passo positivo, mas insuficiente.

“A decisão de integrar esta iniciativa é boa. Agradeço aos governantes por isso. Mas precisamos fazer um pouco mais. Não basta mostrar aos de fora que queremos ser honestos. É cá dentro que a honestidade deve ser visível”, reforçou.

O Tchota, segundo o coordenador, tem estado a participar activamente no processo, incluindo a recente eleição dos representantes da sociedade civil para o grupo multi – participativo da ITIE em Angola.

“O que nos interessa é ver como as populações que vivem nas zonas de exploração participam nas decisões que afectam as suas vidas. Elas não devem ser apenas informadas, mas devem fazer parte do processo decisório”, defendeu.

Esperança num futuro melhor

Questionado sobre se acredita em dias melhores, Ntoni-a-Nzinga respondeu com firmeza:

“Essa é a minha fé. Acredito em dias melhores, logo que todos aceitemos que temos que fazer o melhor para todos participarem. Enquanto houver uns que participam e outros não, não podemos dizer que está tudo bem.”

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