Em entrevista ao programa Hora da Indústria Extractiva (espaço multimédia dedicado à promoção da transparência e boa governação no sector), o padre Celestino Epalanga, Secretário Executivo da Comissão de Justiça e Paz e Integridade da Criação da Conferência Episcopal de Angola e São Tomé (CEAST), alertou para a falta de transparência no sector da mineração em Angola, denunciando a ausência de informações claras sobre os lucros gerados, a má aplicação dos recursos e os impactos sociais e ambientais nas comunidades afectadas.
O Sacerdote católico, criticou duramente a falta de transparência na gestão dos recursos naturais no país, especialmente no sector da indústria extractiva.
Segundo o sacerdote, apesar dos abundantes recursos naturais como diamantes, petróleo e ferro, a população das regiões onde esses bens são explorados continua mergulhada na pobreza.
“Há um paradoxo da abundância. Em zonas como Cabinda, onde o petróleo é explorado há quase um século, a pobreza é gritante. O mesmo acontece nas Lundas com os diamantes e no Cuchi com o ferro. Os recursos saem, mas não há sinais visíveis de desenvolvimento”, afirmou.
O Missionário Jesuíta revelou que a CEAST tem desenvolvido o projecto “Direitos Humanos, Indústria Extractiva e Vida”, actualmente implementado nas províncias da Lunda Norte e Lunda Sul. O principal objectivo é capacitar as comunidades para defenderem os seus próprios direitos, especialmente o direito à terra.
“Muitas vezes as comunidades são desalojadas, perdem suas terras, suas florestas, seus rios, e não têm sequer acesso à justiça. Por isso, estamos a formar líderes locais para se tornarem defensores dos seus territórios.”
Sobre a adesão de Angola à Iniciativa para a Transparência nas Indústrias Extractivas (EITI), o padre Celestino afirma que, apesar da intenção ser positiva, o país corre o risco de ser suspenso da iniciativa por não cumprir com os requisitos básicos.
“Não basta aderir à EITI. É preciso viver o espírito da transparência. A legislação até existe, mas o problema está na aplicação e, sobretudo, na ocultação dos contratos celebrados entre o governo e as multinacionais”, reforçou.
Questionado sobre as empresas do sector que publicam relatórios, Epalanga mostrou cepticismo: “Alguns relatórios dizem que houve consulta às comunidades, mas não é verdade. Há muita ficção nesses documentos. É preciso confrontá-los com a realidade no terreno. Por isso, os nossos relatórios, produzidos no âmbito do projecto, serão públicos e entregues ao Executivo, à Assembleia e às próprias empresas.”
O sacerdote também denunciou obstáculos enfrentados durante as visitas às zonas de exploração. “Há lugares onde não se pode entrar. Mesmo após comunicação oficial, somos impedidos. Há empresas com segurança fortemente armada, com tanques de guerra, que controlam totalmente o acesso”, contou.
Além disso, Epalanga alerta para o impacto ambiental e a ausência de contrapartidas sociais. “As empresas extraem, destroem a natureza, poluem os rios, devastam florestas e vão embora sem qualquer plano de recuperação ambiental. Não constroem escolas, nem hospitais. As comunidades ficam abandonadas.”
Sobre a actuação de líderes comunitários, o padre lamenta que “alguns sobas são corrompidos para ceder terrenos comunitários”, o que, segundo ele, contribui para a perpetuação da opacidade e da exploração.
Por fim, deixou um apelo directo às empresas e às autoridades: “Reitero as palavras do Papa Francisco: os recursos da criação são para todos, mas devem ser explorados de forma sustentável e com responsabilidade social. É urgente que se promova a justiça ambiental, a equidade e o desenvolvimento verdadeiro das comunidades.” A CEAST continuará a sua missão de promover os direitos humanos, a justiça social e a integridade da criação, contribuindo, segundo Epalanga, para “tirar a indústria extractiva da sua actual zona opaca e trazê-la para a luz da transparência que beneficia toda a nação”.